Manu, de nome Manuel, viúvo de 79 anos, amigo de Rita, minha amiga (nomes fictícios de pessoas reais), comunicava-se sempre com ela, há anos. Durante o isolamento social para controle da Covid-19, em 16 de março deste ano, Manu passou a falar pouco. Um dia, até lembrou-se do quanto, divertiram-se muito juntos, mas que no isolamento do quarto, de seu apartamento, onde viviam mais três pessoas, sentia-se muito infeliz. No centésimo dia daquele isolamento, trocara zaps com Rita e, queixara-se de estar imensamente triste. Com a chegada da pandemia e enclausurado, sua existência sumira, disse. Seus familiares protegiam-no ao máximo, pois era idoso e, por isso, vulnerável àquela virose. Tinham medo de que ele morresse. Dissera também que não havia TV, redes sociais, caminhadas em círculos dentro do quarto, que trouxessem alento àquela vida, sem vida. Perdera a esperança; a incerteza dominara seu pensamento. Deduzira: “Sou apenas um velho que pega doenças à toa”. Estava com medo, que somara-se ao da família.
Quando chegou a hora de largar o isolamento, não o fez. Deixara de funcionar: nem banho queria tomar. “Alimentar-se para que, se nem existia?”, falou. Rita sentiu a evidência da depressão nele. Tentou dissuadi-lo do medo e o estimulou a consultar-se. Ele, então, silenciou seu celular e sua voz. Em 4 de julho fora tirado daquele quarto, morto por enforcamento.
A Covid-19 tem levado muitos “Manus” ao suicídio. A “gripezinha” é mortal também pelo isolamento do ser, pouco assistido; promove a solidão, que leva à depressão e, as vezes, ao suicídio que mata um indivíduo, a cada 40 segundos no Mundo, diz a OMS (Organização Mundial da Saúde).
Andrew Solomon, autor do livro O demônio do meio-dia, acrescenta em entrevista à Folha de S. Paulo, que a depressão está subnotificada e citou a pandemia da Covid-19 como um dos fatores, provocadores da doença, pelo isolamento, gerando solidão, incertezas sobre o presente e o futuro, medo e disfuncionalidade do ser, que pode não suportar o intenso sofrimento transitório do viver, levando-o ao suicídio. Aos que desejam controlá-la, recomendou ter rotinas como: dormir e alimentar-se bem, não exagerar nas bebidas, frequentar as redes sociais, conversar muito e pedir ajuda terapêutica, pois a depressão tem controle.
Dra. Márcia Alcântara Holanda
Médica pneumologista; coordenadora do Pulmocenter;
Membro da Academia Cearense de Medicina
pulmocentermar@gmail.com
Fonte: O Povo