O discurso apresentado pelo Presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Dr. Fernando Lundgren, por ocasião da Solenidade de Abertura do XI Congresso Brasileiro de Asma e VII Congresso Brasileiro de DPOC e Tabagismo ocorrida no dia 02 de agosto de 2017, no Centro de Eventos do Ceará.
Uma jovem pneumologista cearense
A turma de médicos que se graduou em 1966 pela Universidade Federal do Ceará, há meio século portanto, certamente não imaginava que, entre eles, estava uma colega de profissão que transformaria a realidade da Pneumologia no estado do Ceará e no Brasil. Aquela jovem médica, entusiasmada com o futuro profissional aberto à sua frente, tinha por algumas de suas características a curiosidade, a inquietação, a criatividade, mas também, a sensibilidade social, a visão humanística, a busca incessante por uma qualidade cada vez maior no atendimento aos pacientes e aos seus familiares. De alguma forma, o sistema respiratório a encantou ainda nova. Em épocas finais dos famosos sanatórios para o tratamento das pessoas com tuberculose no nosso país, ela aprendeu a atender com desenvoltura aqueles indivíduos estigmatizados com febre, tosse, hemoptoicos, consumpção, dispneia. Ao examinar e auscultar os pulmões daqueles pacientes maltratados pela tísica e identificar uma profusão de sons dos mais variados significados semiológicos, sentiu mesmo a vocação para conhecer e cuidar melhor desses pacientes. Segundo ela própria confessa em rodas de conversa, isso foi motivador, talvez até sedutor, para que abraçasse a emergente especialidade da Pneumologia e Tisiologia. Ela foi literalmente fisgada pelos pulmões.
Assim se tornara pneumologista após concluir a residência médica na especialidade em 1968. Foi admitida para trabalhar como especialista no Hospital de Messejana, agora chamado de Hospital Dr Carlos Alberto Studart Gomes, nome do diretor à época, em 1979. Naquela unidade, destacou-se para além da assistência aos pacientes, que diga-se, fazia e ainda faz, com maestria. Lá trabalhou por 15 anos, até 1994, tendo coordenado a residência médica em Pneumo nos últimos 5 anos, sendo também preceptora de internos, tendo contribuído para a efetivação do R3 em Broncoscopia. Coordenou o Centro de Estudos do Hospital com sessões clínicas de alto nível. Ao longo do tempo, duas vertentes que transformariam sua vida e a de muitas pessoas foram fundamentais:
a silicose e a asma. Foi lá , na enfermaria de Pneumo do Hospital de Messejana, que pela primeira vez, seria feita uma descoberta diagnóstica das mais relevantes: o primeiro caso de silicose em um cavador de poços do estado do Ceará. Da segunda metade da década de 80, até meados dos anos 90, coordenou um grupo de pesquisa, quase uma força tarefa, que resultou na descoberta de centenas de casos de jovens cavadores com silicose na serra da Ibiapaba, fronteira com o vizinho estado do Piauí.
Nesse processo conseguiu descrever e publicar os fatores de risco ocupacionais envolvidos na aquisição da grave doença, tendo publicado trabalhos nacionais e internacionais, culminando com o Prêmio Nacional pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia com o trabalho:
Silicose em cavadores de poços: da descoberta ao controle, em 1998. O resultado concreto deste trabalho foi a erradicação da doença naquela região e, porque não, a descrição de um modelo de trabalho a ser estudado e reproduzido para erradicação de doenças de causa ocupacional no Brasil. Nesta linha de trabalho, obteve mestrado em Saúde Pública, na área de Epidemiologia, pela Universidade Federal do Ceará em 1999. Em paralelo, a outra grande paixão, a asma, de modo algum era deixada de lado. Ao contrário, realizou, de modo inovador e ousado, quatro encontros Norte/Nordeste sobre Asma, evento chamado carinhosamente de ASMÃO, que ocorreram entre 1986 e 1994. Em 2002, coordenou o I Encontro Brasileiro sobre Asma, e hoje
estamos aqui em um Congresso Brasileiro sobre a Doença. Pelo menos em parte, isso se deve ao seu trabalho pioneiro. Por isso mesmo, considera-se uma Asmóloga e não somente Pneumologista.
A medicina privada e vida associativa foram e ainda são pilares da sua atuação profissional. Em 1992, fundou a clínica Pulmocenter, referência no atendimento a pacientes com doenças respiratórias, sendo também um centro de reabilitação pulmonar, único do tipo na cidade. Em 2006, foi a primeira presidente de Congresso Brasileiro de Pneumologia e Tisiologia, realizado
em Fortaleza, até hoje rememorado como um dos melhores dos últimos anos. Criou o PROAICA – Programa de Atenção Integral a Criança com Asma de Fortaleza e coordenou o Programa de Controle da Asma Moderada, Grave e de Difícil controle – (PROCAM) unindo colegas da especialidade e de outras profissões como fisioterapia, farmácia e enfermagem, na luta por um controle efetivo da asma, que vem dando ótimos resultados que se refletem na redução das admissões hospitalares ou visitas às emergências. Como não poderia deixar de ser, a sua inserção na sociedade em geral é forte, sendo personalidade facilmente encontrada como autora de artigos em jornal, participando frequentemente de programas de rádio e TV. Mais recentemente, numa iniciante carreira literária, seremos brindados com um livro de sua autoria. Será um
romance? Vamos conferir. Pelo seu histórico, cabe esperar ainda mais. Meio século de carreira parece muito, e é, mas é quase certo, que para ela própria, seja um tempo relativamente curto. É fato que sua capacidade criativa, sua sensibilidade para os acontecimentos do mundo, para a vida em sociedade, sua paixão pela medicina e pelo cuidado com a saúde das pessoas seguem tão joviais quanto do dia da sua formatura, e se duvidarem dessa afirmativa, convido-os a dois dedos de prosa com a mesma, para quem quiser rejuvenescer. Que os ares da maturidade, da sabedoria e da paz, de quem fez o que fez, continuem a inspirar a “jovem” pneumologista cearense, farol da especialidade na terra da Luz.
Dr. Fernando Luiz
Cavalcante Lundgren
Pneumologista
Presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia